Devo lutar contra meus desejos?

Mensagem de 15 de setembro 2014 – Prem Baba

Pergunta: Querido Mestre, o corpo e a mente não param de desejar. Devo lutar contra esses desejos, mesmo eles sendo minha realidade neste momento. Às vezes, penso que é mais fácil dar alimento para o lobo do mal do que para o lobo do bem. Tem algo de errado comigo?

Prem Baba: Não. Não há nada de errado com você. Esta questão traz alguns insights. Primeiro que a natureza do corpo e da mente é desejar. O corpo precisa muita coisa: comer, dormir, ir ao banheiro, tanta coisa… E ele vai continuar precisando. A natureza da matéria é te chamar. A questão é se você atende ou não o chamado. O que nos leva ao segundo insight: você não é o corpo, nem a mente. E enquanto estiver identificado com o corpo e com a mente você será vítima do desejar. O desejar é um poço sem fundo. A questão não é realizar um desejo ou outro, mas sim interromper o desejar. Atender um desejo é simples, pois é o ponto específico.

Você quer um carro novo? Você vai e compra um carro novo. Quer uma casa? Vai e compra a casa. Quer um namorado novo? Você conquista um novo namorado. Isso é simples. Para alguns é um pouco difícil, mas é questão de tempo para se tornar fácil. Questão de tempo para superar o auto-ódio que se manifesta de não parar de realizar os seus desejos. A questão é: quanto tempo dura o contentamento da realização desse desejo?  Porque por trás existe um fogo devorador que é muito difícil de apagar. Uma compulsão de desejos. É como um desejar, algo ininterrupto. Existe uma desconexão com a fonte. Por trás desse desejar existe uma falta de clareza da sua identidade. Podemos dizer que o desejar nasce de uma crise de identidade, porque por mais que esteja identificado com o corpo e a mente, você sabe que isso não é você. Por que você sabe? Por conta do buraco, este vazio que nunca se preenche e quando você atende o desejo esse vazio é preenchido temporariamente, porque por certo período de tempo essa crise de identidade é contida.

Por exemplo, você compra o carro novo e estende a sua identidade para o carro. Você dirige o novo carro e sente que é o carro. Neste momento você não tem uma crise de identidade. Você acha que você é o carro, mas logo você percebe que você não é. O entusiasmo desse encontro com a identidade é efêmero porque passa muito rápido. Aí você tem um desejo de construir uma casa; você leva mais tempo porque tem que desenhar; que construir até que este desejo é atendido e mais uma vez você sente: “Eu sou esta casa”. Parece ter encontrado a referência de quem é você, mas logo o vazio volta de novo e aí você quer encontrar um namorado, quer casar. Com raras exceções após três dias você descobre que também não é você. Durante três dias você diz: “Ah, esse sou eu”. Desfila com o namorado, ou namorada, mas não é possível sustentar essa identificação por muito tempo.

Existe um estudo científico na neurociência que determina o tempo da paixão. Dura no máximo três anos por causa da química que é liberada pelo cérebro. E aí se existe maturidade para atravessar a noite escura, o casal pode chegar ao amor. Caso contrário vão continuar procurando, mas o fato que três anos, meses ou dias, não faz diferença. A questão é que a referência de identidade se desfaz com o tempo e você continua com o vazio e desejando.

A forma que a entidade encontra para aliviar esse vazio, e entenda este vazio como uma profunda angústia, é obtendo coisas, não importa se é pessoa ou objeto. Isso é assim. Qual a natureza de um buraco negro? É atrair tudo o que está ao redor.

Parece que tentar interromper esse desejar não é inteligente. Não é sensato porque você está lutando contra uma tremenda força e que talvez sua mente seja muito pequena diante dela. E não há nada de errado com a natureza do desejo. É assim. O que está errado é acreditar que você é o corpo e a mente que deseja.

Às vezes, nesse processo de mudança de eixo de identificação você se propõe a uma austeridade inteligente. Você se propõe a não dar um determinado alimento para uma compulsão específica dentro de você, como na história que já contei do Lama tibetano que estava no Ocidente encantado com o iogurte. Estava numa conferência e havia iogurte de sobremesa e ele na fila atento a quem pegava iogurte, e quem não pegava iogurte e observou que ficava com raiva quando alguém pegava iogurte, porque estava com medo que não sobrasse para ele. Até que chegou a vez dele pegar e ele disse: “Não vou dar iogurte para esse viciado dentro de mim.”

Se você pode compreender a natureza do desejo e está em condições de dizer: “Esse aqui não sou eu; eu não vou dar droga para esse viciado dentro de mim.” Jay Ho! Se você pode reconhecer a voz do eu inferior dentro de você e não dar alimento para ela, você adquire uma vitória. É uma vitória do Divino em você. Essa austeridade precisa ser inteligente porque se você simplesmente reprime o desejo, ele se torna mais forte. É como colocar mais palha seca no fogo. Você pensa que está apagando, mas está aumentando o fogo.

Há que se ter bom senso para lidar com o desejo. Estamos falando de andar sobre o fio de uma navalha. Enquanto você não responder a grande pergunta: “Quem sou eu?” Inevitavelmente estará sendo vítima do desejar.

Qual o ponto de equilíbrio? Quando deve alimentar o lobo bom ao invés do lobo mau? Quando você se propõe a realizar uma austeridade inteligente, uma portinha que se abre é o suficiente para te absorver por completo. Você se propõe a fazer a austeridade e ficar um ano sem comer iogurte: uma colher pequena que põe na boca, acabou. Você é tragado pelo desejar. Requer mesmo que você se comprometa com a austeridade estabelecida, mas isso só é possível se for uma austeridade inteligente. A austeridade inteligente nasce da compreensão.

Até o nosso próximo encontro.

Namaste.

Fonte: http://www.sriprembaba.org/